terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Fashion Travel - A grandiosidade de Versalhes e o Petit Trianon


A princesa Maria Antonieta tinha apenas 14 anos quando deixou seu discreto palácio na Áustria para se tornar a Rainha da França. Mesmo sendo uma princesa, por cartas comentou seu deslumbramento quando foi apresentada à corte de Versalhes. Uma reação normal, considerando que o local possuía 67 mil metros quadrados e dois mil cômodos, por onde circulavam 10 mil pessoas, entre nobres e serviçais.
Tudo era excessivo, exceto o conceito de privacidade. Na magnificência da corte francesa, até a troca de roupa da rainha era acompanhada por dezenas de pessoas organizadas de acordo com uma rígida hierarquia. 
A corte inteira acompanhou os sete anos que o rei Luís XVI demorou para consumar o casamento. 
Muitas fofocas, mas muitas festas e prazeres os espelhos deste palácio já viram. E certamente é isto que podem imaginar os milhões de turistas que hoje visitam esta grandiosidade.







Os jardins do Palácio de Versalhes: a combinação magnificente e megalomaníaca entre a arquitetura da opulência e a natureza milimetricamente esculpida em jardins recortados como figuras de papel machê e árvores podadas das mais diversas formas. Caminhos percorridos pela total falta do que fazer, pela melancolia dos ricos esquecidos e pelo desespero dos perseguidos pela Revolução.






Sufocada pela etiqueta e principalmente pelo tédio conjugal, Maria Antonieta ganhou um espaço para respirar quando o marido lhe deu de presente sua própria casinha, o Petit Trianon, uma construção que particularmente sempre atraiu a minha atenção. 
O Petit Trianon é uma jóia neoclássica de proporções elegantes e dimensões humanas, em comparação com Versalhes.
A construção fica no extremo oposto em relação ao palácio principal dos enormes e suntuosos jardins. Ali, só entravam os convidados pessoais da rainha. Com poucos dourados – de novo, comparativamente – e paredes pintadas num cinza clarinho que ficou conhecido como o gris Trianon, virou o cenário onde Maria Antonieta fazia festas, jogava, exercia seus dotes artísticos e desfrutava os prazeres negados pelo marido relutante.
Um dos ambientes mais conhecidos é a antecâmara com o retrato de Maria Antonieta segurando uma rosa, feito por Élisabeth Louise Vigée-Le Brun. 
Grupos acompanhados de guia agora podem conhecer o mezanino, onde ficavam as acomodações da camareira e da dama de companhia da rainha e uma pequena biblioteca, e o 2º andar, onde os quartos foram montados de modo a rememorar outros períodos e outras moradoras ilustres do Petit Trianon. "Depois da revolução, todos os móveis foram vendidos. Aos poucos, muitos foram recomprados ou doados e há vinte anos já vinham sendo reformados, à espera dessa restauração interna", explica o arquiteto Lablaude.
Maria Antonieta gostava muito de flores, e é por isso que as flores estarão presentes no ensaio fotográfico "Século 18", da Fashion History, inspirado na rainha absolutista, que mandava bordar dálias, escolhia meticulosamente as flores que estampariam seus vestidos, enfeitava seus cabelos com flores, amava a vida no campo  e foi retratada segurando uma rosa. 
O Petit Trianon foi originalmente construído pelo rei Luís XV para sua amante, Madame de Pompadour, que morreu antes que o palácio ficasse pronto. Amante morta, amante posta – e Madame du Barry se tornou, temporariamente, a dona do pedaço. Quando ganhou o palacete, com jardins e edificações adjacentes, Maria Antonieta imprimiu o próprio toque. 






Seu primeiro grande projeto foi a instalação de uma espécie de cortina de espelhos localizada em frente à janela do seu quarto. Assim, sentia a intimidade protegida. Como toda mulher que tem orçamento ilimitado e muitas idéias de decoração, foi mudando tudo. Entre os temas recorrentes em quadros, enfeites, tecidos e móveis, a natureza e muitas flores. Era lá que Maria Antonieta estava em 5 de outubro de 1789, quando recebeu a notícia de que a população enfurecida estava nos portões de Versalhes. No dia seguinte, ela, o rei e os filhos foram levados para Paris, depois para a prisão e, por fim, para a guilhotina.
Manteve a linha, portanto, até o último momento, ainda que vestida de trapos. Em sua última carta, escrita à cunhada, na Áustria, da torre onde estava presa, ela dá orientações de educação aos filhos, pede perdão a Deus, diz que morre na fé católica e na certeza de que não traiu a França - das acusações que lhe foram feitas nada foi provado.
Subindo as escadas do cadafalso, tropeçou e acidentalmente esbarrou em um dos guardas. Polidamente falou: "Perdoe-me, senhor, não foi minha intenção".
Maria Antonieta cometeu o mesmo erro que a maioria de nós cometeríamos se tivéssemos a chance da opulência ao alcance de nossas mãos - e no caso dela, não havia outra vida a escolher: ser indiferente às necessidades dos demais. Ouso dizer que já estaria parcialmente desculpada só pelo desprezo sexual do marido. Não há Prada, Gucci ou Chanel que paguem um grande amor, grande amor este que ela parece não ter tido - ao menos não se perpetuou como deveria - e que ela canalizou para os filhos.
Maria Antonieta teria feito tantos vestidos, sapatos, jóias e perucas se o marido não tivesse gasto tanto tempo nas caçadas, ignorando-a solenemente?
Quanto desprezo os cartões de crédito de hoje em dia não são capazes de sublimar...
Felizmente, as guilhotinas de hoje são o nome sujo no SCPC, mas persistimos com a mania de não culpar o sistema e sim uma única pessoa - se for mulher, fashion e bonita, melhor ainda - pelos descaminhos de uma nação.
Tantos "ses" que passam pela cabeça dos que visitam a morada dos personagens históricos que talvez tenham experimentado a mais abrupta das antíteses da vida: o ser bajulado e ser humilhado, desmedidamente.




Fonte: Revista Veja.

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